Quem nunca comeu escondido na cozinha, não sabe o que é
sentir adrenalina de verdade. Estranhamente, enquanto você come aquele pedaço de
bolo que sua mãe proibiu e ouve atentamente, procurando por sons de passos, a
comida parece ter um gosto a mais. A qualquer sinal de aproximação, seja
por alguém levantando do sofá ou se ajeitando na cadeira
do escritório, você já retesa o seu corpo, pronta pra esconder a
prova do crime e pegar um copo na pia, fingindo que foi para a cozinha com o proposito único de
beber água, e não de comer o queijo que está guardado na geladeira. Mas é claro
que toda a pessoa gulosa que se prese tem suas táticas, quando se trata de não
ser pega no flagra ou até mesmo de fugir de situações de risco, como
quando seu irmão passa pela porta da cozinha enquanto você ataca o pote de
Nutela.
Por exemplo: vamos supor que você, como citado acima,
resolva satisfazer suas necessidades por açúcar, quando, nesse exato
momento, seu irmão passa casualmente em frente a porta da cozinha. O que fazer?
Bem, você tem duas possibilidades: lamber todo o conteúdo da colher e
jogá-la na pia, com uma expressão inocente no rosto, ou ficar parada. E quando
eu digo ficar parada eu digo parada mesmo. Imóvel, olhando
atentamente para a frente, sem ousar respirar e implorando para que ele não note
a figura com cara de culpada, com o pote de Nutela na mão. É claro que em 99
por cento dos casos isso falha, especialmente se você estiver comendo algo
barulhento como um resto de salgadinho que seus pais compraram em alguma
ocasião e que todos já haviam esquecido. Mas em uma situação de pânico as
pessoas agem por impulso.
Também existem as táticas dos esconderijos: na
minha casa a lavanderia fica atrás da cozinha, portanto é sempre um bom
esconderijo. Imagine-se na seguinte situação: sua mãe terminantemente proibiu
que você comesse aquela batata palha do almoço do dia seguinte, só que você,
movida por um impulso rebelde de gula, acaba cedendo à tentação e comendo a
batata direto do pacote. Então, você ouve sons de passos se aproximando da cozinha.
A ideia de fugir logo se forma na sua mente e a imagem da lavanderia aparece
junto dela. Não dá tempo de fechar o saco e guardar, isso faria muito barulho.
Você pode ver a sombra do seu pai começando a aparecer e, com adrenalina
jorrando nas veias e a famosa frase do filme 300 sendo gritada na mente, você
se joga atrás da maquina de lavar pensando apenas: "THIS IS ESPARTA!”.
Devo dizer que essa é uma das minhas estratégias mais bem sucedidas. Em 95 por
cento dos casos, minha família nem nota a figura encolhida na sombra
da máquina de lavar com um pacote de comida nas mãos.
Mas, como nada é perfeito, tem sempre aquela vez em que tudo dá errado. Quando você ouve os passos se aproximando e não se mexe. Você vê a
sombra entrando na cozinha e, mesmo assim, continua parado, pensando que vai
dar tempo. E é só quando sua mãe entra na cozinha e começa a te passar um
sermão, porque você não devia estar comendo aquele resto de macarrão do almoço, que você se arrepende de não ter corrido. Essa atitude tem muitos nomes: gula,
fome, burrice, desespero. Mas na minha opinião, a palavra que melhor descreve
tudo isso é GORDICE . Por isso meus companheiros do crime, compatriotas da
gordice, não se enganem: não vai dar tempo de dar
aquela ultima colherada no leite condensado ou de roubar mais um pedacinho da
borda da pizza. Você vai ser pego no flagra.
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